O novo protocolo chega a ser três vezes mais eficiente em milhos tropicais
Um artigo, publicado na revista Frontiers in Genome Editing no início de dezembro, traz a aplicação de um protocolo de transformação genética do milho baseado no uso de “reguladores morfogênicos” para as linhagens da planta próprias às condições tropicais. O novo protocolo, considerado um avanço importante para acelerar a edição genômica de plantas de milho para a região tropical foi desenvolvido pelos pesquisadores do Centro de Genômica Aplicada às Mudanças Climáticas (GCCRC), uma iniciativa da Embrapa e da Unicamp, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
De maneira geral, as linhagens tropicais de milho não respondem de forma tão eficiente ao processo de transformação genética, necessária para os experimentos de edição genômica. O resultado com o novo estudo chegou a ser três vezes mais eficiente em tais linhagens quando comparado com o protocolo-modelo, que é baseado nas linhagens desenvolvidas para condições de clima temperado.
A edição genômica na agricultura é considerada uma ferramenta poderosa perante às mudanças climáticas pois possibilita, por exemplo, o desenvolvimento mais rápido de variedades agrícolas mais tolerantes à seca, a doenças ou mais nutritivas. O estudo do centro de genômica aplicada ao clima foi realizado com plantas de uso proprietário e público, o que facilitará o acesso a novas pesquisas.
Atualmente, os quatro maiores produtores de milho do mundo são os Estados Unidos, China, Brasil e Argentina. Em 2023, o Brasil tornou-se o maior exportador, suplantando os Estados Unidos. A região tropical é responsável por 30% da produção mundial do cereal. Entretanto, a produtividade do milho em regiões tropicais está significativamente aquém daquela nas áreas temperadas.
Segundo os autores do artigo, essa disparidade decorre de desafios como a baixa fertilidade do solo, infestações de pragas e cultivo dependente da chuva, agravados por uma história de melhoramento genético recente em comparação com as variedades de milho temperadas.
As linhagens de milho usadas como modelo de estudo são, em sua maioria, de regiões temperadas, cujo desempenho nos testes de campo no Brasil não é satisfatório. “Estas plantas não estão adaptadas ao clima tropical, e assim não têm uma performance tão boa nessas regiões”, explica José Hernandes, autor do estudo que desenvolveu a pesquisa durante seu estágio de pós-doutoramento no centro de genômica.
Outra barreira nos processos de edição de milho é a baixa eficiência dos protocolos tradicionais de transformação genética. A transformação é um método pelo qual um DNA externo – que, neste caso, contém genes que promovem a edição genômica – é introduzido nas células, permitindo a expressão ou alteração de genes específicos.
Na pesquisa, os autores exploraram uma nova estratégia de biologia molecular que está sendo bastante promissora na transformação de milho: o uso de genes que estimulam o processo de regeneração das plantas transformadas, os chamados genes reguladores morfogênicos.
“O protocolo que usamos, desenvolvido pelo nosso colaborador Laurens Pauwels, na Bélgica, foi preparado para uma linhagem temperada e funcionou muito bem para mais da metade das tropicais que testamos”, relata o pesquisador Ricardo Dante da Embrapa Agricultura Digital, um dos autores do estudo.
Três das cinco linhagens tropicais foram transformadas com sucesso usando a estratégia de expressão de genes morfogênicos, chegando a taxas de eficiência três vezes maiores do que a média dos protocolos que não usam esta estratégia, alcançando 6,63%.
“Agora temos uma linhagem de estudo mais adaptada às condições de campo local” aponta Hernandes. Isto significa linhagens com alta susceptibilidade à transformação, capacidade de gerar plântulas saudáveis e agronomicamente adequadas para estudos em condições reais de produção no País.
Instituições públicas brasileiras na ponta
Outra preocupação do grupo de pesquisadores foi realizar os testes utilizando simultaneamente linhagens comerciais brasileiras e linhagens não-proprietárias. Estas últimas vieram do Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo (CIMMYT), uma organização sediada no México que conserva germoplasmas de milho. O Centro de Genômica tornou-se o repositório nacional de algumas linhagens da coleção de germoplasma do centro mexicano no Brasil. Qualquer instituição que queira usar este material pode contactar o centro.
“É importante que tenhamos instituições públicas liderando este processo, de modo que todo mundo possa ter acesso ao conhecimento gerado”, nota a pesquisadora Juliana Yassitepe, da Embrapa Agricultura Digital, outra autora do estudo.
Segundo os autores, os resultados do estudo expandem a disponibilidade atual de plantas que podem ser geneticamente editadas com sucesso, o que vai acelerar a pesquisa biotecnológica no país. “Agora que conseguimos editar e transformar milho tropical vamos testar genes desenvolvidos pelo Centro mais rapidamente e em condições de campo”, explica Yassitepe. O principal foco do centro é o desenvolvimento de linhagens de milho tolerantes à seca.
A pesquisa, que contou com o financiamento da Fapesp, é resultado da parceria do centro com VIB (Vlaams Instituut voor Biotechnologie) da Bélgica, e com a pesquisadora visitante Sofya Gerasimova, do Instituto de Citologia e Genética, da Academia Russa de Ciências e da Universidade Estadual de Novosibirsk (Rússia), também apoiada pela Fapesp.
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